domingo, 23 de maio de 2010

A Instituição Educativa e a Educação


“O nível de desenvolvimento duma sociedade é determinado pela capacidade de aprender permitida pelas instituições. [...] Não é o fenómeno de aprender, mas o de não-aprender o que requer explicação.”
Habermas, citado em Arroteia, 1991


A escola vive da vida que os actores sociais que nela desempenham papéis significativos lhe querem atribuir. Aceitar que a escola não é só um espaço de ensino, é mais do que dizê-lo ou afirmá-lo nos discursos educativos: é assumi-lo nas práticas, mesmo correndo riscos e enfrentando resistências. A escola, deve proporcionar saberes, competências sociais, hábitos, valores que cubram o leque de problemas e situações com que os indivíduos se irão defrontar ao longo da vida, uma via mais imprevisível e mutável do que aquela a que esta instituição procurou dar resposta para as gerações anteriores.

“Embora desejando-se o mais integrada possível na comunidade local, a escola não deixa de sofrer as influências mais dispares e as tensões mais controversas oriundas não só do seu corpo interno (corpo docente, discente e funcionários), mas ainda das outras instituições e sectores que compõem a própria sociedade” (Arroteia, 1991, p. 50).
Cada segmento da sociedade desempenha uma função diferente, no interesse da totalidade dos objectivos comuns. Ao analisarmos a sociedade, podemos definir três sistemas:


· Sistema Económico - A economia de uma sociedade atende à função de proporcionar alimentos, abrigo, bens e serviços a seus membros através de organizações que, ao mesmo tempo, proporcionam empregos e dinheiro para possibilitar que os seus membros comprem bens e serviços;

· Sistema Político - Regula a sociedade, proporcionando segurança e protecção aos seus membros e coordenam as outras diferentes instituições da sociedade;

· Sistema Educacional - A manutenção e contínuo crescimento da sociedade através da criação, conservação e transmissão de conhecimentos às gerações futuras; (Schein, 1982, p. 11).

“Não podendo situar-se fora de um determinado contexto político, económico e social, o sistema educativo deve, antes do mais, ser considerado como uma rede de interacções complexas, que o obrigam a ter em conta a realidade social envolvente de forma que este não seja considerado como uma ilha no seio dos restantes sistemas sociais” (Arroteia, 1991, p. 55).

Mesmo funcionando a escola como um sistema aberto e exercendo a sua influência sobre os restantes sistemas sociais, o sistema educativo perde nalguns casos, as características de inovação que lhe devem estar associadas. A tal não será estranho, como salienta Arroteia (1991) o facto de ser muito difícil “assegurar a estabilidade favorecendo a mudança, promover a inovação sem originar a ruptura, incentivar a criatividade e a participação colectiva embora transmitindo toda uma herança histórica e cultural, um legado de ideias, de crenças e uma matriz de valores que assegurem a coesão e a continuidade das sociedades contemporâneas” ( p. 34).

Aquilo que torna o ensino uma actividade moral, é o facto de se tratar de uma acção humana que é desenvolvida, tendo em conta, outros seres humanos. O aluno é acima de tudo pessoa. Pessoa, titular de direitos e deveres, em busca de uma educação, pessoal e social, assente em princípios como a liberdade e a solidariedade e, susceptível de o ajudar a encontrar um sentido para a vida. “A educação dirige-se à formação integral da pessoa e, consequentemente, ao bem da sociedade de que o homem faz parte, em ordem à realização de uma emancipação colectiva e de um equilibrado desenvolvimento individual “ (Reimão, 1997, p. 150).

“Não esqueçamos, no entanto, que as expectativas que cada um de nós tem da escola são elaboradas a partir de um certo número de padrões, de modelos culturais e de experiências acumuladas que identificam o nosso modelo de sociedade “ (Arroteia, 1991, p. 28).

Porém, o ensino deve ser personalizado: esforçar-se por valorizar a originalidade, apresentando opções de iniciação às diversas disciplinas, actividades ou artes, e confiando esta iniciação a especialistas que possam comunicar aos jovens o seu entusiasmo e explicar-lhes as suas próprias opções de vida. O aluno é senhor dos seus itinerários do saber e dotado de inteligências múltiplas: emocionais, artísticas, estéticas, práticas, relacionais e outras. “A educação procura obter o desenvolvimento maximalizado da pessoa e caracteriza-se por um esforço constante de valorização e de actualização das potencialidades internas do indivíduo“ (Reimão, 1997, p.151).

A escola deve em colaboração com as outras instituições, “cultivar” a abertura de museus, teatros, bibliotecas, cinemas e, dum modo geral, o conjunto de espaços culturais próprios de cada país, a fim de dar aos futuros adultos o sentido da emoção estética e o desejo duma familiaridade constante com as diversas criações do espírito humano. A escola não pode ser uma mera transmissora de conhecimentos prescritos, deve viver da investigação, não da repetição maquinal de saberes. Os professores devem ser cientistas que lideram os alunos na sua aprendizagem, não meros técnicos treinando aprendizes em rotinas. Para isso, o professor tem de ser concebido como uma pessoa e um profissional em desenvolvimento e formação contínua, capaz de criar e transformar contextos educativos que ultrapassem os limites estritos do espaço escolar, das disciplinas e das áreas do saber.

“A formação contínua compreende todo o processo de desenvolvimento profissional e pessoal do professor ao longo da sua carreira [...] e pressupõe que a sua realização seja claramente estimulada e enquadrada pelo próprio funcionamento quotidiano da escola como estrutura e como organização” (Ponte, 1994, p. 11).

Todos, temos direito à educação e à cultura. Porém, como poderemos praticar esse objectivo quando sabemos que as práticas educativas e avaliativas têm vindo a penalizar, sobretudo, aqueles a quem democraticamente a escola abriu as portas, hierarquizando-os, seleccionando-os, rotulando-os e marginalizando-os, mais uma vez, como se a própria vida não se tivesse já encarregado disso. Ou, quando não se faculta as oportunidades a quem desejoso de alcançar o saber, se vê constrangido pela entidade patronal que jogando com o factor económico, faz o cidadão ter que optar entre a sua própria sobrevivência e a educação. Ora, isso é um erro, porque na sociedade contemporânea, o capital intelectual diz mais sobre a rentabilidade futura das organizações, do que, os métodos tradicionais. Como afirma Tom Peters (1995) “os cérebros estão na moda. É esta a natureza essencial da nova economia, baseada no conhecimento. Daí, o desenvolvimento do conhecimento ser a tarefa principal das organizações.” (p.16).

Num contexto em que é cada vez mais difícil conquistar uma vantagem competitiva sustentável, os investimentos na reputação cívica de uma organização, são uma alternativa estratégica a considerar. Deste modo, ao apoiar esses geradores de mudança, estarão a tornar a sua organização mais forte, mas também, a contribuir para o bem-estar das comunidades em que se inserem, porque “o processo de formação é um processo de transformação pessoal” (Ponte, 1994, p.14).

Nos próximos anos, as escolas e as universidades irão mudar mais drasticamente do que nunca, desde que, assumiram a sua forma actual quando se reorganizaram em torno do livro impresso. Os factores que vão obrigar a essas mudanças são, em parte, a nova tecnologia, como os computadores, os vídeos, a Internet, as transmissões via satélite; e em parte, as exigências de uma sociedade baseada no conhecimento, onde a educação organizada se deve transformar num processo para toda a vida. Mas, não é só na escola que isso ocorre. A dinâmica do conhecimento impõe um claro imperativo: todas as organizações têm de incorporar a gestão da mudança na própria estrutura.

Deste modo, todas as organizações estarão sempre em competição com as demais na busca do seu recurso mais essencial: as pessoas qualificadas e sabedoras. Talvez por isso, não seja de estranhar a nova filosofia implementada, que defende serem as pessoas o principal activo das mesmas.

Mas, a procura do conhecimento e da formação num plano individual não pode motivar ao aparecimento das forças do individualismo. Essas forças, sustentadas num sistema económico excessivamente competitivo que faz constante apelo ao triunfo sobre os outros, legitimando o domínio do mais forte, desprezando valores tão essenciais como a solidariedade, a bondade, a amizade, o amor e o respeito pelos outros devem ser combatidas. A democratização na educação não consiste apenas no imperativo abstracto de levar educação a todos os cidadãos, mas, muito concretamente, em alargar cada vez mais a quantidade e a qualidade da educação que se proporciona.

Ora, isso implica que todos, cada vez mais, vejam na educação um meio do seu desenvolvimento e afirmação como pessoas. “É verdade que a escola ganha um significado maior numa sociedade em que a criação das pessoas pelas pessoas toma o lugar do primado da produção material que temos tido” (Martins, 1998, p.3).

Assim, são intoleráveis sistemas de educação onde a exclusão - manifeste-se ela sob a forma de abandono escolar, repetência múltipla, ou condenação pedagógica - seja um resultado sistemático, relegando largos contingentes de concidadãos ao insucesso humano mais vasto. “A escola terá de ser de cidadãos, de jovens cidadãos, na medida das suas capacidades, implicando nas experiências a levar efeito, pais, autarquias locais, associações, ou seja todos os membros da comunidade” (Martins, 1998, p.4). O desafio que se nos coloca presentemente, é maior, visto que nos cabe tornar essa escola, acessível a todos e não apenas a uma elite. Para isso, é preciso investir na escola e voltar a considerá-la um importante espaço de mobilidade social e o grande motor de desenvolvimento do País.

Deste modo, estaremos a ajudar a criar uma sociedade educativa, onde tudo pode ser ocasião para aprender e para desenvolver os próprios talentos. “Uma sociedade culta diferencia-se pela presença de instituições culturais, de publicações diversas, de manifestações artísticas, de obras educativas, de pessoas qualificadas, etc.” (Arroteia, 1991, p.29). Como amigo do saber, o professor sabe que ensinar é um “produto misto de características pessoais, de conhecimentos fundamentados e de técnicas adquiridas” (Ribeiro, 1989, p.127) e um meio admirável para aprender. Porque, como defende Peter Drucker (1997), “o método mais importante para promover o desenvolvimento das pessoas é empregá-las como professores. Ninguém aprende tanto como um bom professor” (p.162).

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